História da Rua do Ouvidor
A Rua do Ouvidor já existia no primeiro século colonização do Rio de Janeiro, com registros de sua existência desde 1578. Se tornou importante ao longo dos séculos, tendo seu auge no século 19 e início do século 20, quando era ponto das melhores lojas e confeitarias do Rio de Janeiro. A rua segue do Largo de São Francisco de Paula até a Rua do Mercado no Centro Histórico do Rio.
A Rua no Século 16
Em tempos mais recentes, no século 19, a Rua do Ouvidor foi muito citada por Machado de Assis, teve sua história contada por Joaquim Manuel de Macedo, que escreveu Memórias da Rua do Ouvidor. Mas história desta rua vem de longuíssima data.
A Rua do Ouvidor é uma das ruas mais antigas do Rio de Janeiro, já existindo por volta do ano de 1578, segunda metade do século 16, quando entrão era chamada de Rua Desvio do Mar. Posteriormente, ainda no mesmo século, a rua passou a se chamar Rua Aleixo Manuel, sendo assim chamada por causa de um de seus primeiros moradores. Com a construção da Igreja de Santa Cruz dos Militares, o logradouro passou então a ser chamado de Rua da Cruz.
A rua teve seu alinhamento na metade do século 17, em 1650, e novamente mudou de nome, passando a ser chamada de Rua do Padre Homem da Costa. Especula-se que um dos quarteirões ou trecho da rua chegou a ser chamado também de Rua do Gadelha, mas deste fato, certeza não se tem.
Rua dos Ouvidores no Século 18
Em meados do século 18, no ano de 1745, a Fazenda Real comprou de um cidadão José de Andrade as casa que ele possuia naquela rua ou logradouro. E lá foram morar os Ouvidores, denominação dada aos magistrados no Brasil do antigo Império Português. Deste modo no Brasil, os ouvidores eram juizes nomeados pelos donatários das capitanais e posteriorente pelos Governadores Gerais e Vice-Reis.
O primeiro ouvidor ou magistrado que foi morar nas casas foi Manuel Pena de Mesquita. Depois veio segundo, que era mais conhecido à sua época, Francisco Berquó da Silva Pereira. E assim, devido à estes fatos, a rua passou a ser chamada de Rua do Ouvidor, desde o a metade do século 18.
Ponto de Excelência no Século 19
A vinda da Corte portuguesa ao Brasil trouxe um novo impulso para o Brasil e principalmente para o Rio de Janeiro. A liberdade de comércio e a abertura dos portos, então promulgada, fez com que muitos comerciantes e negociantes estrangeiros viessem estabelecer seus negócios e lojas na capital do emergente pais.
Estes novos comerciantes, introduziram lojas de artigos variados, e muitos deles voltadas para artigos da moda e costumes das grandes cidades da Europa. A Rua do Ouvidor foi o local onde muitos destes comerciantes estabeleceram suas lojas, e desde aquela época, a rua se tornou um endereço de elegância pelos próximos 100 anos.
Na Rua do Ouvidar estavam instaladas as melhores lojas de artigos finos, lojas de roupas de modas, cabeleireiros de senhoras, perfumarias, cafés, confeitarias, joalherias, casas de música e livrarias que assim atraíam para o local a sociedade elegante da época.
Em alguns dias semana, na parte da tarde, a Rua do Ouvidor se tornou um ponto quase obrigatório, por onde compareciam e circulavam as pessoas que pertenciam ou pretendiam pertencer à mais fina sociedade de sua época. Segundo uma aguçada observação de um estrangeiro viajante, a Rua do Ouvidor era uma espécie de "Clube ao ar livre", onde a sociedade se encontrava. Poderia-se dizer também, que a Rua do Ouvidor teria sido o primeiro "Shopping Center" do Brasil.
Todas aquelas lojas, mas especialmente as confeitarias, lojas de modas e novidades, joalherias e casas de música serviam de pretexto para as inúmeras senhoras da sociedade que por lá circulavam. Por sua vez, os políticos e intelectuais frequentavam principalmente os cafés e também as livrarias, e as redações dos jornais que cujas sedes lá se instalavam. Antigamente era comum ler as notícias recém chegadas em murais nas portas das redações assim como comprar os jornais recem saídos das mãos dos vendedores de jornais que saiam portando algumas quantidades de jornais para vender aos passantes pelas ruas da cidade.
Assim, a Rua do Ouvidor era também a "rua dos jornais", e a lista de folhas que tiveram suas redações naquele endereço era extensa. O local se tornou um ponto de honra para um Jornal que almejasse bom conceito e respeito de seus leitores.
Do lado esquerdo, movimentada rua de comercio no Centro do Rio e do lado direito vitrine de loja de roupas também no centro da cidade, ambas da última década do século 19. Observe que três damas elegantes aparecem caminhando enquanto o cavalheiro da esquerda parece ajustar o bigode ao passar pelas mesmas. O cavalheiro que vem pela direita, parece fumar um charuto.
Segundo Luiz Edmundo, um famoso cronista e jornalista do final do século 19, antes da abertura da Avenida Central, o principal cenário da vida elegante no Rio de Janeiro era a rua do Ouvidor. Em 1900, a rua que ele chamou de "beco de luxo, estreito e sinuoso", ainda segundo ele, contava com 313 prédios, sendo que o trecho em que a elite comprava artigos importados ou passava as tardes nas confeitarias, ficava entre o Largo de São Francisco e a Rua dos Ouviveis, atualmente chamada de Rua Miguel Couto.
O cronista mencionou que nos os quarteirões daquele trecho, ficavam lojas como Falais Royal e Chapelaria Watson, entre muitas outras do mais requintado luxo e aparato, que serviam à melhor clientela. Vitrines nobres com vidros de cristal compunham as lojas, com arcos de entrada em boa cantaria (pedra talhada, granitos), de madeira de lei envernizada ou mámores, destoavam de um casario irregular, e segundo ele de vulgar arquitetura. Como contra crítica, veja a foto de Marc Ferrez, de 1890 na animação topo da página para se ter uma idéia do ambiente da época.
Quanto ao ambiente das lojas o cronista descreveu que lá se viam caixeiros e patrões
Nelas vêem-se caixeiros (balconistas) e patrões trajando uniformes de linho branco, muito limpos, muito bem barbeados, afetando modos e maneiras, exibindo sorrisos corteses e falando em francês.
Acima partes ampliadas de fotos de Marc Ferrez, mostrando detalhes de um dia cotidiano na Rua do Ouvidor e outra rua com caracteristicas similares do Centro do Rio de Janeiro em 1890. Na pode-se ver que os homens sempre usavam chapeu, embora de diferentes modelos. Em uma das imagens que se alternam, ao passar o mouse sobre as mesmas, vemos um homem carregando um maço flores, provavelmente um mensageiro ou entregador. É possivel também ver peças do mobiliário urbano da época, como as grandes luminárias afixadas nas paredes.
A Rua do Ouvidor no Século 20 e Início de Século 21
Até o início do século 20, a Rua do Ouvidor ainda era um endereço ligado à elegância e o maior movimento e as lojas mais finas se encontravam no trecho entre o Largo de São Franciso e a antiga Rua dos Ouríveis, hoje chamada de Rua Miguel Couto.
Com abertura da moderna e ampla Av. Central, atualmente chamada de Av. Rio Branco, no início da primeira década do século 20, muita coisa mudou no Rio. Para a abertura da Avenida muito do antigo casario foi demolido. E a Rua do Ouvidor teve um techo entrecortado pela Avenida Central.
Com a abertura da recém inaugurada Av. Central, os holofotes se voltaram para a moderna Av. que passou a ser o endereço comercial mais moderno e de maior destaque da cidade. Entretanto, a Rua do Ouvidor não perdeu sua importância de ponto comercial, importância esta que mantém até os dias de hoje.
Inúmeros pontos comerciais e cafés que um dia existiram na famosa Rua, nenhum deles sobrevive, exceto na memória e tradições da cidade, eternizados em crônicas literárias.
A rua foi profundamente modificada em termos de arquitetura, assim como em termos de costumes. Muitos edifícios que já eram de mais de dois ou três andares, foram demolidos, e no seu lugar construídos altos edifícios de salas comerciais, com lojas no térreo.
Entretanto, nesta rua que foi um imenso teatro em termos de hábitos e costumes, em até meados do século 20, ainda nela se encontravam muitos estabelecimentos comerciais tradicionais, no mesmo local, e com o mesmo tipo de comércio, sendo que alguns destes contavam com mais de um século de existência.
Talvez na naquela rua, possam existir 3 gerações de edificações em alguns terrenos, sendo a primeira dos tempos coloniais, a segunda construida sobre demolição ou reforma na segunda metade do século 19 ou início do século 20, e a terceira geração de edifícios em estilo moderno ou de influência arte-deco, ao longo do século 20.
Rua Para Pedestres
Não é de pouco tempo que a Rua do Ouvidor se tornou uma rua exclusiva para pedestres, ou somente permitida para o transito de pessoas. Por decreto de Dom Pedro I, no ano de 1829, após o seu primeiro calçamento, foi feita a proibição de transito de carros de boi. Nesta época, carros de bois eram sinônimo de tráfego pesado ou de veículos pesados, o equivalente à caminhões dos dias atuais. Entretanto ainda era permitido o trafego de veículos leves.
Um nova e mais extensa proibição, em 1861, feita pela Câmara Municipal, proibiu o trânsito de qualquer típo de veículos como também de cavaleiros após as nove horas da manhã. Ou seja, de 9 da manhã até o anoitecer, a rua destinava-se apenas aos pedestres.
Uma rara exceção à este fato, acontecia durante o carnaval, quando então era permitida a passagem de cavaleiros e carros alegóricos puxados por burros, durante os desfiles da grandes sociedades carnavalescas. É curioso saber deste fato, mas era naquela rua tão estreita, que os mais importantes desfiles de carnaval aconteciam na segunda metade do século 19. Estes desfiles contavam com carros alegóricos e fantasias de luxo, contanto com pessoas da alta sociedade entre os participantes, e certamente desfilar na Rua do Ouvidor aumentava o prestígio dos desfiles naquela época. Estes desfiles tinham uma feição totalmente diferente das atuais escolas de samba.
Ultima Tentativa de Mundança de Nome
No final do século 19, a Prefeitura tentou mudar o nome da rua para Moreira César, em homenagem ao comandante da expedição organizada contra os jagunços de António Conselheiro. As placas da rua foram mudadas, e durante anos mostravam o nome do Coronel Moreira Cesar. Entretanto, na chamada "boca do povo" a rua continuava a ser Rua do Ouvidor, e por fim acabaram por designar a rua novamente pelo seu nome tradicional.
Travessa do Ouvidor
Para não haver confusão, deve-se dizer que, existe também no centro do Rio uma outra rua chamada Travessa do Ouvidor. Esta travessa, provavelmente leva este nome porque liga a Rua do Ouvidor à Rua Sete de Setembro (antiga Rua do Cano).